terça-feira, 7 de junho de 2011

Melancias de Santo Antônio

"Glorioso Santo Antônio, grande amigo do senhor, escutai nosso pedido, sede nosso protetor". É cantando em procissão que os melancienses enviam aos céus suas preces e suas orações, numa forma de agradecimento e súplica ao seu santo padroeiro. O pequenino distrito das Melancias, assim mesmo no plural, cravado no interior do sertão paraibano, respira festa, emoção e fé todo dia 13 de junho. Em meio a terra árida e rochas esculpidas pelo tempo, o povoado se une e se prepara para receber seus filhos e filhas. Enfeita a praça central com bandeiras e balões, arrumas as mesas, organiza quermesse e constrói uma passarela para o desfile de rainhas e príncipes que têm no seu curto reinado a inocência revelada nos olhos. Enfeita-se, principalmente, de felicidade e de alegria. Qualquer melanciense sabe do que estou falando. Carrega na memória lembranças cheias de saudades como se carregassem um pote de ouro. Na festa que celebra não só o padroeiro, pode-se enxergar um encontro de gerações celebrando, também, a vida. Tudo começa com a trezena de Santo Antônio. São treze dias de orações que culmina com a coroação do padroeiro. A festa religiosa, com missa, cantos e agradecimentos por uma graça alcançada. Em meio a devoação e respeito, uma procissão sai da igreja, que traz o nome do padroeiro, Santo Antônio, e segue desenhando a geografia das Melancias. Com velas que mais parecem vagalumes em noite sem lua iluminando as ruas, o melancienese se torna um só na voz e na fé no Santo que os observa silencioso de lá de cima do andor. Ao retornar à igreja, a queima de fogos que sobe em direção aos céus, leva consigo uma prece de cada um como se fosse uma maneira de chegar mais rápido e mais próximo do Pai Celeste. Viva a Santo Antônio! Vivaaa! E pode-se ouvir os estouros dos fogos brilhando no céu iluminando as faces dos que aqui em baixo ficam, renovados pela fé e esperança.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Eu e o outro

Um friozinho bom e meus passos vão se tornando cada vez mais apressados. A lua alta, silenciosa, me observa em segredo. Eu, porém, a observo como se quisesse alcançar seu mistério. Lanço sobre ela um olhar curioso e me contento com um pensamento que trago das noites de lua clara que iluminva o sertão. Outros tempos. Apresso novamente o passo e o frio se torna mais intenso. A lua imóvel poetisa sem palavras a noite que desce sobre a cidade numa espécie de brinde extra. Sigo minha caminhada entre meus pensamentos e os muitos atletas que perpassam por mim a cada instante. Alguns bem mais apressados, outros, lentos, enchendo o peito de ar e esvaziando em forma de prece. Meu pescoço dói, paro e alongo minha coluna. Estou envelhecendo, penso. Vou enfrente. Começo a observar quem passa. Rostos aliviados. Mas nem todos. Uns com aspecto de dor, insitem em continuar correndo. Meu Deus, digo a mim mesmo. Entre tantos que observei, um me chamou mais a atenção. Um senhor, já com seus quase 70 anos talvez, caminhava lentamente. Silencioso. Olhar para o nada. A sua solidão se mostrou generosa e eu pude ali dividir com ele a minha. Me via nele. Fui gradativamente ajustando os meus passos para caber no seu mundo. Olhava pra ele quase implorando um sinal, um olhar de volta, um gesto. Ele seguia como se não se importasse. Me senti filho. Me senti seguro. Queria que ele soubesse. Fiquei imaginando como seria a sua vida. Ele, porém, inviolável. Tinha traços de alegrias, percebi. Será que tinha alguém esperando ele em casa? Filhos, netos, esposa. Tentei decifrar algo mais a seu respeito. Nada. Com seus passos firmes, retos, não parecia ter pressa e mantinha-se indiferente a tudo ao seu redor. Nem uma tosse, um suspiro, uma demosntração de cansaço. O seu mundo era só seu. A lua ainda mantinha-se no nosso horizonte, meio baixa, meio torta, mas lá, assim como os segredos de cada um que por ali passava. A noite se tornava mais densa e mais fria e começava a se distanciar, a crescer na escuridão como o nosso silêncio, que crescia à medida que a gente ia se afastando para que cada um mantivesse a sua vida em segredo. Nada mais.