terça-feira, 26 de maio de 2009

Olha pro céu meu amor

Que você fosse meu padrinho que São João mandou. Três voltas ao redor da fogueira, pronto, estavam feitos os laços sagrados de apadrinhamento. Assim era o São João no interior do Nordeste, enfeitado de rezas e do folclore mágico que dava sentido à imaginação. Manifestações populares passadas de geração a geração. Era de costume as pessoas se reunirem para celebrar os santos do mês de junho em missas solenes. Como também era de costume se reunirem ao redor de uma grande fogueira. Sinto o cheiro da madeira que era escolhida, especialmente, para ser queimada naquelas noites. Madeira seca, não molhada, falava a voz da experiência. Cada família construía a sua, numa espécie de ritual. Mas o ritual também era de cada um, cada um na sua ansiedade, na expectativa que fazia tudo ser melhor, maior. Ah, como eu poderia saber que a expectativa era o melhor da festa. Se alguém tivesse me dito isso, teria construído expectativas gigantescas. Teria guardado todas em uma caixinha invisível. Logo ao anoitecer as fogueiras eram acesas. O fogo clareava longe e aquecia o friozinho costumeiro naquele mês. As brasas salpicavam o chão de estrelas vermelhas que tinham a duração do pensamento. A missa abria os festejos e era a primeira obrigação, não no sentido mais literal, mas cristão. Uma devoção, eis o que era. Mas os festejos não se limitavam a rezas somente. Além das orações pedindo ou agradecendo pela fartura, saúde, casamentos, havia também a parte dançante, que na maioria das vezes se estendia madruga afora. A noite se tornava testemunha da homenagem. Estrelas vestiam o céu. Cá em baixo peças inteiras de chitas enfeitavam os salões paroquiais. O grito de "quem dá mais", anunciava que a quermece tinha começado. Nessa noite de estrelas, acontecia a escolha da Rainha do Milho representada por meninas e seus padrinhos, que traziam consigo uma quantia em dinheiro pras obras da igreja. O maior valor depositado no envelope dava o premio à Rainha candidata. Os desfiles apresentavam os concorrente. Enquanto isso, as primeiras paqueras envergonhadas, mas intencionalmente desejadas, experimentavam o primeiro beijo. Olhos das damas e cavalheiros corriam o salão à procura de um par, tendo como aliados a sanfona que encorajava os mais tímidos. Lá fora, as horas sendo queimadas, assim como a fogueira que ia se consumindo madrugada adentro. A noite abençoada pelos santos vai adormecendo cada ums numa orção sertaneja ao dizer "vê como ele está lindo, olhe praquele balão multicor que lá no céu vai subindo".

terça-feira, 5 de maio de 2009

"hoje o tempo voa amor...

...escorre pelas mãos, mesmo sem se sentir que não há tempo que volte...". Metade de nós parece ser só saudade e a outra metade, divide-se em segundos e se aventura no futuro.
A vocês, caros leitores, um breve relato. Boa leitura!
- Só com o passar do tempo é que percebemos as nossas escolhas. O quão elas foram acertadas ou não. Casamos com a pessoa que achamos ser a certa. E praquele momento talvez o fosse. E nessa escolha não cabe gênero. Com essa escolha, vamos construir uma vida cheia de segredos e de silêncio. Rotineiramente tomamos café da manhã, almoçamos, vamos ao cinema, saímos pra dançar, partilhamos sonhos e construimos família. Tudo isso se arrasta de maneira misteriosa, quase inquestionável. A vida passa. A rotina cresce e com ela suas sombras, que vão se alimentando de coisas absolutamente mecânicas e reais demais. Os anos passam. Num belo dia, o mal humor toma conta. Palavras que antes serviam para elogiar, são ditas cheias de formalidades que assustam. Cada um se pergunta o que aconteceu, onde foi quebrado a harmonia. Os problemas são pesados demais para suportar. Os filhos crescem e a gente parece diminuir. O que nos sustentava, agora nos faz demolir. Vamos mergulhando numa vida tão distante da que tinha planejado. Falta ar e ao mesmo tempo vem aquela vontade de viver, de sair voando pela janela em busca do que ficou pra trás. Depois vem o medo. Vem a dor da separação, vem a preocupação com os filhos e por último a pergunta quem sempre esteve ali: o que vai ser de mim? Foi tudo um engano? Meu Deus, como pode? Como pude não perceber que não era ele o grande amor da minha vida? E a resposta só veio 15 anos depois. Parecia tão tarde. Mas no primeiro encontro com o meu passado, tive a certeza, depois do fatídico engano, que aquele era o amor que eu merecia. No amor a gente só se engana uma vez, pensei. Hoje adormeço sempre na esperança de acordar e ver que tudo passou, que o engano me pegou na inocência dos meus sentimentos. E sei que posso recomeçar, e me tornar livre enquanto vivo o amor que deixei adormecido em mim por não saber que podemos cometer suicídio com os nossos sonhos. Mas eles sempre voltam.